Uma livraria com um nome pra lá de curioso tem realizado um trabalho no mínimo formidável na Vila Buarque, em São Paulo. Se engana quem ache que o mundo da literatura é formado apenas por homens, e a livraria Gato sem Rabo nos apresenta um universo de opções com mais de 1500 títulos de livros de diversos gêneros assinados apenas por escritoras.
A ideia surgiu quando Johhana Stein, idealizadora da livraria, fazia sua pesquisa e constatou que era difícil se deparar com escritoras mulheres em termos de referências bibliográficas. Com isso, durante sua pesquisa, foi fazendo um levantamento para ela mesma, entre amigas e outras pesquisadoras, de nomes e obras que a interessavam e começou a surgir uma vontade de reunir esses nomes, esses livros, essa produção textual, de alguma maneira. Em 2019, ela começou a se aproximar de algumas pessoas que trabalham no mercado editorial, e foi conversando com editoras, tradutoras e se aproximando um pouco desse universo. Foi quando entendeu que faria sentido que essa pesquisa tivesse um espaço físico e nisso surgiu a Gato sem Rabo. Que não deixa de ser uma livraria tradicional, pois conta com livros de todas as áreas do conhecimento — ficção, poesia, contos, romances, infantil, uma área dedicada à geração Z. Tem uma parte de estética, arquitetura, arte e uma parte de humanidades, considerando teoria política econômica, de exatas e filosofia. Fazendo assim um recorte e trazendo para o centro do debate essas escritoras mulheres. O nome Gato Sem Rabo vem de um ensaio escrito pela Virginia Wolf. E ele suscita uma imagem muito potente, essa metáfora, do gato sem rabo, da qual a Virginia se utiliza, ela pressupõe uma falta. Esse animal que falta um pedaço dele, que seria o membro que lhe daria o equilíbrio. O que ela traz com essa imagem é que justamente essa falta é uma potência. Isso significa que, às vezes, a gente tem que olhar para essas faltas e assumi-las. Essas mulheres que sempre lhe faltaram tempo, espaço, legitimidade, têm na Gato sem Rabo esse espaço dedicado a elas. Que mesmo com todas essas faltas ou barreiras, elas possam ter um espaço para se colocar. A falta é mais no sentido da gente olhar o que é essa falta, na verdade. Johhana conta que talvez um dos principais objetivos da Gato sem Rabo seja desmistificar essa noção de que a narrativa masculina é universal. De que os clássicos são escritos por homens, a voz universal, a voz neutra é masculina. A gente tem essa questão com a própria língua portuguesa. Então, ela acha importante olharmos para essa produção e desmistificar certos paradigmas. A mulher produz clássicos, ela escreve sobre filosofia, ela produz uma infinidade de conhecimentos e ela escreve sobre todos os assuntos. E é para mostrar que essa produção existe e trazer visibilidade para ela que estamos aqui. Porque a gente tem falado muito sobre isso. Hoje a questão não é mais a gente questionar se as mulheres escrevem ou não porque está mais do que claro que elas escrevem. Mas sim questionar o por que que elas não têm os mesmos créditos e divisão nas pesquisas (e prateleiras).
A livraria Gato sem Rabo fica na Rua Amaral Gurgel, 338 na Vila Buarque e funciona de Terça a Domingo.
Saiba mais em https://www.instagram.com/gato.sem.rabo/
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