Em sessão de debates no Plenário do Senado na tarde desta sexta-feira (26), especialistas fizeram sugestões para agilizar o processo de adoção no Brasil. Medidas como maior investimento no serviço público, incentivo à participação das entidades civis e mais divulgação para programas de entrega de bebês para adoção legal foram algumas das sugestões para melhorar o sistema nacional de adoção.
O senador Eduardo Girão (Novo-CE), autor do requerimento para o debate, foi quem dirigiu a sessão. Ele informou que, em 2021, havia mais de 46 mil pretendentes a adotar cadastrados em todo o país e menos de 4 mil crianças e adolescentes aptos para adoção. Para o senador, falar em adoção é falar em vida, pois “adoção é amor em ação”. Ele lamentou a burocracia que envolve o processo e disse esperar que essas crianças encontrem um lar "decente, acolhedor, seguro" e, principalmente, amoroso. Girão também destacou que o Dia Nacional da Adoção é celebrado anualmente no dia 25 de maio.
— É um assunto que tem avançado, mas precisamos avançar ainda mais, pois são vidas que precisam desse olhar de carinho. Temos um difícil, mas belo desafio pela frente — declarou Girão.
A senadora Daniella Ribeiro (PSD-PB) disse ter a consciência da dificuldade dos processos de adoção e registrou que é necessário aprofundar a discussão sobre o tema. O senador Jorge Seif (PL-SC) afirmou que a sessão temática é importante por falar de amor e adoção. Para o senador, a adoção se torna ainda mais importante quando há em setores da sociedade "a defesa intensa de temas como o aborto".
O senador Magno Malta (PL-ES) contou que a experiência mais maravilhosa que passou, “depois de conhecer Deus”, foi ser pai adotivo. Emocionado, ele disse que adotar é a chance de “um homem dar à luz”. O senador lamentou a grande fila da adoção e afirmou que o filho adotivo é que faz bem aos pais, e não o contrário. Malta ainda contou que três irmãos da sua filha adotiva foram entregues a um casal da Itália que seria pedófilo. Segundo o senador, esse caso será levado ao Ministério da Justiça e à embaixada da Itália.
— Para quem está doido para adotar, a régua não deve ser seu cabelo ou a cor do olho. A regra deve ser o amor. Eu posso dizer que sou um homem privilegiado, pois eu adotei — registrou.
O deputado Paulo Fernando (Republicanos-DF) também discursou durante a sessão. Segundo ele, há 104 projetos que tratam de adoção tramitando na Câmara dos Deputados. O parlamentar lamentou a burocracia que envolve os processos de adoção e pediu a criação de mais varas especializadas nos estados.
A chefe do Núcleo da Infância da Defensoria Pública do Distrito Federal, Tatiana Sandy Tiago, defendeu a importância da adoção legal. Ela disse que, na verdade, o poder público busca uma família para a criança, e não o contrário. A defensora explicou que nem todas as crianças acolhidas em instituições estão aptas para a adoção, pois é preciso primeiro procurar um contato com parentes, para uma possível reintegração à família biológica. Por isso, pontuou, algumas adoções pretendidas não são concretizadas.
Para agilizar o processo de adoção, Tatiana Sandy defendeu mais divulgação dos programas de entrega de bebês para adoção legal e mais investimentos nos serviços públicos que tratam do processo de adoção. Outra medida sugerida seria um incremento na busca ativa por pais que querem uma criança ou um adolescente fora do perfil mais procurado. Conforme a defensora, o prazo para a entrega da criança aos pais adotivos, cumpridas todas as regras, é de 120 dias. No entanto, ponderou a defensora, os prazos se dilatam, pois não há servidores suficientes para atuar nesse serviço específico para que a adoção ocorra de “forma mais célere”.
— É possível [o processo de adoção] ser mais rápido. Se não houver condições de reintegração com a família, a criança vai para a adoção. Mas falta pessoal para todo o processo — alertou a defensora.
Desembargador do Tribunal de Justiça do Paraná (TJ-PR) e representante da Associação dos Magistrados Brasileiros (AAMB), Sérgio Luiz Kreuz disse que as principais causas do acolhimento de uma criança são a negligência, o envolvimento com drogas ou as ações violentas por parte dos pais. Ele reconheceu que as crianças mais velhas e com irmãos têm mais dificuldades de serem adotadas.
Segundo Kreuz, problemas de procedimento e de estrutura nas varas de infância comprometem a celeridade do processo de adoção. Ele reconheceu avanços na legislação, mas apontou que ainda há muito a fazer. O desembargador informou que alguns estados têm programas específicos para adoção tardia e pediu mais divulgação para essas iniciativas. Também defendeu mais investimentos nos setores públicos que tratam da adoção e cobrou a ampliação dos programas de famílias acolhedoras, que cuidam das crianças de instituições, mesmo não tendo a guarda.
— Cidades com mais de 200 mil habitantes têm que ter varas de infância e juventude exclusivas, com equipes técnicas capacitadas, o que hoje não acontece — registrou o desembargador.
O juiz Redivaldo Dias Barbosa, da 1ª Vara da Infância e Juventude do Distrito Federal, ressaltou que a entrega voluntária legal é uma realidade que vem substituindo a adoção fora das previsões legais. Ele sugeriu que o Congresso Nacional pense em medidas para flexibilizar a fila para a adoção, de forma que alguns processos sejam agilizados. Já a presidente da Associação Civil Quintal da Casa de Ana e membro da Comissão Estadual Judiciária de Adoção Internacional do TJ-RJ, Bárbara Toledo, pediu empatia com a situação das crianças sem lar. Ela também disse que a entrega legal é um ato de amor e sugeriu a criação de penas para a desobediência aos prazos legais no processo de adoção.
A especialista em direito da criança Isabely Fontana da Mota, pesquisadora do Departamento de Pesquisas Judiciárias do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), informou que hoje há cerca de 31 mil crianças acolhidas no Brasil. Segundo ela, o processo de acolhimento de crianças está ligado à falta de políticas públicas. O fato de a imensa maioria das crianças deixadas em abrigos serem de famílias pobres é, segundo a especialista, uma evidência dessa falta de políticas públicas.
De acordo com Isabely Mota, os serviços públicos acompanham, de forma atenta e “sem julgamento”, as mulheres que querem entregar seus filhos para adoção. Ela também disse que vem crescendo o número de adoções de crianças acima de dois anos e ressaltou que há resultados positivos no uso da ferramenta do CNJ que trata da busca ativa para crianças fora dos perfis mais desejados para adoção.
— O nosso objetivo é sempre fazer um processo de adoção com foco na criança, que todas as crianças acolhidas tenham uma família — destacou Isabely.
O presidente da Associação Nacional de Grupos de Apoio à Adoção (Angaad), Paulo Sergio Pereira dos Santos, que é filho e pai adotivo, também discursou durante a audiência. Segundo ele, uma boa notícia é que a resistência à adoção de crianças negras vem diminuindo ao longo dos últimos anos. Santos defendeu uma maior presença da sociedade civil nos trâmites de adoção, como forma de agilizar todo o processo, e pediu a criação de uma frente parlamentar voltada para as políticas de adoção. Promotores, vereadores, servidores públicos e representantes de entidades que trabalham com o processo de adoção também participaram da sessão de debates.
A sessão de debates foi feita de forma interativa, com a possibilidade de participação popular. O senador Girão destacou algumas das mensagens que chegaram por meio do portal e-Cidadania.
A internauta Jéssica Sena, do Rio de Janeiro, pediu que o processo de adoção seja mais humanizado. Viviane Ribeiro, da Bahia, questionou a falta de políticas voltadas para a adoção de adolescentes. Já Gabriele Ramos, de Minas Gerais, manifestou preocupação com o tráfico de crianças.
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