Em turno suplementar, a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) aprovou, nesta quarta-feira (8), o substitutivo ao projeto ( PL 1.958/2021 ) que prorroga por dez anos e amplia para 30% a reserva de vagas em concursos públicos para pretos, pardos, indígenas e quilombolas. A matéria, que recebeu 17 votos favoráveis e 8 contra, segue agora para a Câmara dos Deputados, salvo recurso para análise em Plenário.
Nesta quarta-feira, o relator da matéria, senador Humberto Costa (PT-PE), deu parecer pela rejeição das emendas apresentadas em turno suplementar pelos senadores Sergio Moro (União-PL), Flávio Bolsonaro (PL-RJ), Rogerio Marinho (PL-RN) e Plínio Valério (PSDB-AM).
Três emendas foram destacadas, sendo duas rejeitadas pelo colegiado. Em uma delas, o presidente da CCJ, senador Davi Alcolumbre (União-AP), precisou desempatar a votação da emenda proposta pelo senador Marinho, que propunha o percentual de 20%, como no projeto original do senador Paulo Paim (PT-RS). Davi acompanhou o relator pela rejeição, o que resultou em 13 votos contrários a emenda, contra 12 favoráveis.
O colegiado acatou, contudo, emenda apresentada durante a reunião pelo senador Alessandro Vieira (MDB-SE) para que se altere, em todo o texto, a expressão “negros” para “pretos e pardos”.
Em primeiro turno, o texto do substitutivo foi aprovado na CCJ no dia 24 de abril, por 16 votos sim a 10 votos não. A redação na CCJ teve como base o relatório do senador Fabiano Contarato (PT-ES), aprovado pela Comissão de Direitos Humanos (CDH).
A manifestação do senador Plínio para que haja diferenciação entre negros e pardos no texto resultou em amplo debate do colegiado, ensejado a partir do artigo segundo do texto substitutivo que definia pessoa negra como aquela que se autodeclarar preta ou parda, conforme o quesito cor ou raça utilizado pela Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Segundo o parlamentar, quando da avaliação na banca de heteroidentificação (verificação da autodeclaração), a pessoa que se declarou como negro, sendo parda, acaba não sendo aceita.
— Pardo não é negro e negro não é pardo. (...) Portanto, o que a gente quer, é evitar que o pardo passe constrangimento — disse Plínio, ao afirmar que os pardos são cerca de 45% da população brasileira.
— Nenhuma demanda identitária será reduzida — argumentou Alessandro, que apresentou a emenda para alteração da expressão “negros” para “pretos e pardos” em todo o texto do substitutivo.
Humberto salientou que essa qualificação “negro”, que consta do relatório, não foi uma invenção; mas está inserida no Estatuto da Igualdade Racial, "que define que negros são pretos e pardos".
— O que está proposta está fazendo é tentar criar todas as condições para que essas pessoas tenham as mesmas oportunidades — afirmou Humberto.
Paim lembrou Nelson Mandela, ao destacar sua citação de que “uma boa cabeça e um bom coração formam sempre uma combinação formidável”.
— Quero apenas nesse final agradecer a todos. Estou convicto que o Senado não vai negar uma ação afirmativa como essa — disse Paim.
A senadora Eliziane Gama (PSD-MA) defendeu que, se a cota não serve para algumas pessoas, serve para outras que precisam ter acesso “para conseguir chegar às universidades, ao Parlamento, ao serviço público”.
O senador Flávio Bolsonaro defendeu sua emenda para que destinem as cotas para “as pessoas que não possuem condições financeiras”.
— Esse projeto a mim não me convence, porque é inconstitucional. (...) eu não tenho o direito de estratificar a sociedade. (...) Há aqueles que defendem que as cotas sociais, como é o meu caso, e há aqueles que defendem as cotas raciais — afirmou Marcos Rogério, que criticou as bancas de heteroidentificação, que a seu ver, definem como devem atender as normas.
Para o senador Carlos Portinho (PL-RJ), a discussão do acesso é importante, mas ele defendeu a ideia da “dignidade da pessoa humana”:
— Nossa Constituição nos iguala em direitos e deveres. Essa discussão de etnia vai pelo lado errado. A discussão tinha de ser socioeconômica.
O senador Rogerio Marinho (PL-RN) também defendeu que a tese racial e étnica está sendo utilizada de maneira reversa.
De acordo com o texto aprovado, serão reservadas para pretos, pardos, indígenas e quilombolas, 30% das vagas disponíveis em concursos públicos e processos seletivos simplificados de órgãos públicos, sempre que forem ofertadas duas ou mais vagas. A revisão da lei será feita dentro de dez anos.
Quando esse cálculo resultar em números fracionários, haverá o arredondamento para cima se o valor fracionário for igual ou superior a 0,5, e, para baixo, nos demais casos. A reserva também deverá ser aplicada às vagas que, eventualmente, surgirem depois, durante a validade do concurso.
Aqueles que se inscreverem em concursos para disputar vagas reservadas, estarão concorrendo também, simultaneamente, às vagas de ampla concorrência. No caso de aprovação nas vagas de ampla concorrência, o candidato não será computado na classificação de vagas reservadas. A emenda apresentada por Moro, mas rejeitada pelo relator e pela maioria dos votantes, buscava abater dos 30% as vagas de pretos, pardos, indígenas e quilombolas obtidas por meio do sistema de concorrência geral, sob o argumento de que a regra prevista no substitutivo acabaria inflando a participação das etnias beneficiadas, ferindo o princípio da pluralidade. Na opinião do senador pelo Paraná, sempre que um cotista fosse aprovado com nota suficiente na disputa ampla, abriria uma oportunidade para outro no cômputo das cotas. Tanto Humberto quanto os senadores que votaram com o relator entenderam que a emenda destacada subvertia o próprio sentido do projeto e conseguiram sua derrubada.
Serão consideradas indígenas as pessoas que se identificarem como parte de uma coletividade indígena e forem reconhecidas por ela, mesmo que não vivam em território indígena. Como quilombolas serão considerados aqueles que se identificarem como pertencente a grupo étnico-racial com trajetória histórica própria e relações territoriais específicas, com presunção de ancestralidade negra.
O relator incluiu parâmetros mínimos para o processo de confirmação complementar à autodeclaração, como a padronização de regras em todo o país, o uso de critérios que considerem as características regionais, a garantia de recurso e a exigência de decisão unânime para que o colegiado responsável pela confirmação conclua por atribuição identitária diferente da declaração do candidato.
Caso a autodeclaração seja indeferida, o candidato ainda poderá disputar as vagas destinadas à ampla concorrência, exceto se houver indícios de fraude ou má-fé, situação em que será excluído do concurso ou, se já tiver sido nomeado para o cargo, terá a sua admissão anulada.
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